domingo, 18 de outubro de 2020

Quase Defunto na Geladeira

 

        

 

         Conforme compromisso firmado entre partes, três leitores e o escrevinhador, fiquei de contar uma outra aprontação do mesmo voo em que fiz o primeiro é único parafuso de minha vida.

         Pois bem, recuperados do cagaço do tal parafuso acidental em que o instrutor nos metera, lá seguimos nós no rumo a Pelotas e Rio Grande.

         Paramos da Princesa do Sul, para uma mijadinha básica e reabastecimento, pois ainda teríamos que ir à região do superporto de Rio Grande fazer  fotos de topo de uma área mais ou menos extensa, isto é, deveríamos ir o mais alto possível.

         No solo tínhamos trinta graus de temperatura, pois era verão. Isso por volta dumas onze horas da manhã.

         Para fazer as tais fotos de topo, o manicaca e retratista bolara um plano infalível: abrir a porta do bagageiro, isto depois de bem amarrado aos cintos da bagagem e uma corda extra, que levara. Aí, era só colocar a cabeça para fora e fazer as tais fotos.

         Só que esquecera do estribo de embarque. O tal ficava bem embaixo da área de visão da câmara. Assim, para fazer as fotos, tinha que estar com a cabeça e a câmara abaixo do estribo desgraçado.

         Confiado na excelente amarração que fizera, não me assustei e dentro do avião ficaram apenas as pernas e um pouco mais, até a região da cintura.

         Todos os ingredientes  para a cacaca.

         Tínhamos subido para doze mil e quinhentos pés. Assim, a temperatura lá estava vinte e cinco graus mais baixa do que no solo. Trinta graus menos vinte e cinco, igual a cinco graus. Acresça-se que o oxigênio lá era bem mais escasso.

         Agora imaginem um sujeito praticamente pendurado pela pernas, com a circulação prejudicada, tomando um vento gelado de 170 km/h no focinho e com pouco oxigênio. Não deu outra: comecei a passar mal.

         Imediatamente tratei de recolher a parte responsável por estes escritos para o conforto da cabine do avião. Mas, quem disse que conseguia me içar de volta para o compartimento da bagagem?

         Ou pelo peso maior do lado externo ou pela fraqueza que começava a dominar-me, já próximo ao desmaio, dei-me conta da realidade: o piloto lá na frente, tendo os assentos traseiros entre nós,comigo fora da cabine, ele nada ouviria se eu pedisse socorro, por certo  o voo ia continuar na maior tranquilidade.

         Até dar-se conta de que algo errado acontecera com o "Lambe-Lambe" Retratista, preciosos minutos ter-se-iam passado.

         E lá estaria o fotógrafo desmaiado e pendurado, com quase todo o sangue na cabeça, tomando um ventão geladíssimo nas ventas.

         Depois dele flagrar-se do acontecido, até perder os doze mil e quinhentos pés e pousarmos em Rio Grande, lá se iriam uns vinte minutos.

         Pensei: "Ou tu dá um jeito de te içar de volta pro avião ou deu pra tua bolinha!"

         Foi como chegar alguém com meio litro de adrenalina pura e  injetar na veia: arranjei forças não sei de onde e, tonto e tudo, consegui ver-me dentro do Tupizinho bendito.

         Não era o dia para a troca de querência: primeiramente por ter-me saído bem dum parafuso acidental sem a mínima experiência com a manobra, apenas papos de hangar e bar; segundamente, por não ter congelado lá em cima, com pouco oxigênio, a uma temperatura enregelante.

         Para terem uma ideia do quanto estava frio, depois de devidamente sentado e amarrado, havendo recobrado o sangue-frio, lembrei-me das fotos a baixa altitude e quis fazê-las.

         E de que jeito, se as lentes estavam tão geladas, que embaçaram externa e internamente? Não adiantava passar um pano macio para limpar o vapor por fora: o problema era interno.

         Tivemos que ficar uns dez minutos voando a uns quinhentos pés, com as câmaras no painel, tomando Sol direto, até se aquecerem e poder fazer as fotos.

         Dez minutos de voo em que via o dinheiro literalmente saindo do meu bolso ...

         E lá estava eu preocupado com o prejuízo?

         Depois das duas aprontações do voo não estava vivinho da Silva?

         Nunca acertei em Mega Sena, Loto, essas coisas. Mas que sou sortudo, isto sou.

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