quinta-feira, 19 de novembro de 2020

E não nos Deixeis Cair em Tentação

 

       

 

       A oração do Pai Nosso, em seu finalzinho, pede para que fiquemos livres dessas quedas.

       E uma classe que sofre muitas tentações é a dos pilotos. Vamos citar algumas das maiores, quando o diabinho tentador fica cochichando no ouvido da gente:

       - Dá um raso a "fu"! Ela tá te olhando! Pode ser que, vendo tua coragem, esqueça tua feiúra!

       - Com essa gasolina dá para ir e sobra!

       - É só uma quedinha de magneto! Se falhar, tem o outro!

       - O vento tá fraco! E vai amainar!

       - Pra que checar de novo, se voaste ontem?

       - Vai só tirar um fino!

       Nessas e noutras tentações muitos caíram! Literalmente.

       Pois hoje vou falar duma tentação especial, em que o manicaca aqui já caiu duas vezes, a de demonstrar o "aparelho" para interessado comprador.

       Já contei o caso em que fui demonstrar um Netuno, lá por 2003 para o Luques e quase nos matamos.

       Cachorro comedor de ovelha e piloto cabeçudo, só matando! O sujeito não aprende!

       Senão, vejamos:

       Estou com meu Kitfox Americano, motor Rotax 912, 1996 (olha o merchandising!) à venda. Além de aparecerem os curiosos que só contatam para encher o saco, tem os que são do ramo e, realmente, querem adquirir um excelente teco (merchandising de novo ...).

       Foi o caso de dois uruguaios que moram em Rivera. Ligaram, marcamos e numa bela manhã de domingo, apareceram para avaliar o aviãozinho, que tem uma das mais rápidas e melhores reações de comando que conheço (dê-lhe merchandising).

       Era bela a manhã e só não perdia a beleza porque vento não se enxerga. Se desse para ver, seria horrorosa ... Mas estava fortezito!

       Os compradores chegaram, vi que gostaram do teco, pois é um convencional, com carenagem imitando a de motor radial, realmente um aviãozinho que agrada à primeira, segunda e muitas vistas.



       Senti que estavam gostando e que havia boas possibilidades de negócio.

       Examinaram o que puderam, mas, claro, ninguém compra avião usado sem vê-lo voando.

       Liguei o Rotax 912, que não me decepcionou  e pegou de primeira. Demonstrei o que deu, com o tequinho parado, mas tinha o tal diabinho cochichando: "Se não voar, é difícil de sair a venda!"

       - Com esse vento, acho arriscado até uma corrida na pista!

       Concordaram:

       - Sim, não te preocupa, não vamos nos arriscar a quebrar a aeronave. Podemos voltar outro dia!

       Mas o tentador replicou baixinho no meu ouvido:

       - Mas não voltam! Dá pelo menos uma corridinha na pista, para mostrar a potência e o torque do Rotax 912, para os 300 kg do "aparelho". Vão ficar impressionados!

       Perguntei se algum deles gostaria de fazer a tal corridinha na pista, e, felizmente, um aceitou, o que tornou o avião um pouco mais pesado para enfrentar o "ventinho", segundo o cochichante.

       Pois o ventinho era de dobrar as taquareiras e as pontas das árvores da chácara. Não tenho anemômetro, mas no medidor crioulo da inclinação dos galhos e ângulo reto da biruta, menos do que 25 km por hora é que não havia de ser a velocidade. Nas previsões, para a região, o mínimo era de 26, chegando aos 36 km/h.

       E a recomendação é de que não se deve enfrentar ventos de través, na decolagem ou pouso, superiores a 17 km/h. Isso para aviões mais pesados, como Paulistinha, Aero Boeiro, etc.

       A vontade de vender era grande, os homens estavam interessados, tanto que um teve o peito de vir de saco.

       - É só uma corridinha na pista! Ele vai se deslumbrar com a potência! - me cochichou a vozinha.

       Cheque de cabeceira, aceleração da manete, lá nos fomos com o vento bem de través, a noventa graus pela direita.

       A cabeceira em uso inicia com a "sombra"  das  frutíferas e outras árvores vindo justamente deste lado. Por isso dou-lhe aileron direito, para baixar a asa e, assim,estar prevenido para o vento real.

       Tudo ia bem senão quando termina a "sombra" e tomamos uma senhora rajada pela direita,  levemente de frente, o que aumentou bruscamente a sustentação.

       Deu a lógica: o teco "despegou-se" como dizem os castelhanos.

       Despegou-se, tentou aproar o vento e, talvez por um efeito lift da coxilha onde fica a pista, a asa direita ergueu-se, nem ligando pro meu comando de aileron, pois estava a baixa velocidade.

       Sempre tive comigo uma ideia bem gravada na caixa de adubo: se a coisa está preta, a menos de metro do solo, tenta não aumentar a chance do agente funerário e procura voltar à pista. É melhor uma queda de asa com o trem quase tocando, do que entrar em faca numa altura maior.

       Cortei motor, tive sorte que a rajada deu uma folga, o Kitfox voltou a tocar a pista, felizmente sem violência, com a asa esquerda lambendo a grama e já saindo campo a fora, literalmente.

       A ventania que empurrava o estabilizador vertical era mais forte do que os comandos que eu dava: pedal esquerdo, freio esquerdo arrastando roda e eu no rumo das capoeiras. E a torcida para que os tatus e zorrilhos não tivessem trabalhado durante a noite, abrindo alguma toca na lateral do "aeródromo".

       Já contava como certa uma pilonagem, com o trem caindo numa toca ou trancando nalgum cupim ou macegão.

       Acho que a rajada deve ter diminuído bastante, pois o valente tequinho começou a obedecer ao pedalaço e freio esquerdo, rumando, aos poucos, para dentro da pista.

       Sorte ou perícia, vou lá eu saber? Ocorreu que dominei o bichinho, levei-o para a cabeceira oposta e, aí, completei a cagada.

       Falei para o uruguaio:

       - Agora, sim, tu vais ver o que é potência, pois dessa cabeceira a pista é a subir!

       Afundei a mão e, como estava prevenido, não havendo saída de sombra de árvores, iniciei a corrida oposta que, por sorte ou mão do Piloto Maior, terminou sem maiores danos, a não ser eventual troca de cuecas de piloto e saco.

       Não sei por que a tal vozinha cochichante sumiu.

       E esclareço: a venda também foi pro brejo.

      

 

segunda-feira, 2 de novembro de 2020

Politicagem e Ciência

         Como se sabe, tudo evolui com o passar do tempo. Às vezes essa evolução é positiva, acrescentadora e trás consigo o progresso.

         A ciência tem evoluído e transformado o mundo, ainda que essa transformação não traga, obrigatoriamente,  grandes desenvolvimentos ou, pior, em algumas oportunidades faz a humanidade engatar  marcha a ré.

         Por causa da constante melhoria da qualidade de vida que a evolução científica nos permite é que muitos  endeusam essa evolução. Há os que o fazem de forma bem intencionada. Acham que, se a ciência fala, todos devem calar-se e aceitar o dito como lei a ser rigorosamente seguida.

         Mas nem sempre é assim: primeiramente porque nem toda a evolução científica é realmente benéfica. Segundo: mesmo sendo útil, muita gente a usa de forma mal intencionada. Vamos pegar o caso da aviação: se os aviões fossem usados apenas para transporte civil, socorro em catástrofes e tantas outras aplicações benéficas, quantas vidas se teriam poupado nas guerras?       

         Com a Covid-19 houve um endeusamento dos ditames alegadamente  científicos a serem observados, como se estes fossem, realmente, a única saída possível.

         Baseados nisso muitos políticos espertinhos justificaram suas atitudes, que nada tinham de científicas e, muitos menos,  de sérias e bem-intencionadas.

         Em raros casos era realmente a ciência que ditava as decisões. Ou, até seria, mas uma ciência barata, venal, interesseira e de variáveis critérios de acordo com o vento soprante. A ciência do venha a mim o Vosso Reino.

         Se não, vejamos: o tal Dráuzio Varella, médico a serviço duma determinada mídia, inicialmente afirmava que o uso de máscaras era inútil e, até, perigoso. Semanas depois, miraculosamente, a máscara era indispensável, segura, eficiente, eficaz, etc. E, em ambos os casos apresentava alegações, supostamente científicas.

         Aqui no Rio Grande do Sul o piá governador, alardeava aos quatro ventos que todas as medidas tomadas e por tomar era guiadas por critérios rigorosamente científicos.

         E aí, cientificamente enviou caminhões-frigoríficos, para receber os inumeráveis cadáveres de mortos pela Covid-19, em Bagé, quando o surto iniciou-se naquela cidade. Científicamente as carretas ficaram semanas por lá, sem nunca serem usadas, pois as poucas mortes por Covid verificadas na cidade,  surgiram bem depois e abaixo das assustadoras previsões.

         Restou  aos motoristas das carretas voltaram, agora empiricamente, para suas empresas. Claro, depois de estas, faturarem cientificamente um bom troco.

         Ainda seguindo os critérios rigorosamente científicos, o jovem governador contratou empresa para a produção e fornecimento de testes rápidos para detectar o contato humano com o letalíssimo vírus. E, por ser uma decisão científica, a empresa escolhida foi uma agropecuária, parece que de Pelotas, coincidentemente, terra do rapaz governante e do proprietário da agropecuária.

         Fique bem claro que os testes eram para humanos. Fique claro, ainda, que dita agropecuária alterou seu ramo de  atividade,  em contrato ou registro comercial,  apenas quinze dias antes de ser escolhida como a feliz beneficiária duma compra envolvendo grandes somas.

         Parece que depois, cientificamente, para não se ver com a Justiça a agropecuária, agora Laboratório Biomédico desistitiu de tal empreitada e , também obedecendo às normas científicas, evaporou-se, saiu do ar e nunca mais se ouviu falar dela. Ou teria ressurgido, cientificamente alaranjada, com outra razão social?

         O pior é que o desperdício do dinheiro suado do contribuinte,  nem de forma científica, nem empiricamente foi reposto pela irresponsável atitude dos governantes interessados em criar um clima de pavor entre a população.

         E a gente se foi dando conta de que a apregoada e salvadora ciência pretensamente aplicada no enfrentamento do Coronavírus, pouco ou nada tinha de científica...

         O  mais lamentável é que essa é uma ciência nova, flexível, moldável. Varia ao sabor dos ventos e dos interesses. A regra científica que vale hoje, na semana que vem já perdeu a validade.

         Não sou infectologista, virologista ou  entendido no assunto. Mas não nasci ontem,  tenho dentes, dois olhos e dois ouvidos. E, assim, por não ser tão burro como os governantes gostariam que eu e a grande maioria da população fosse, acho estranha, muito estranha essa flexibilização científica.

         Primeiro era para ficar em casa a todo o custo. E isso levou muita gente à falência, ao desespero, ao suicídio. Mas o tempo foi passando e, junto, as variações científicas. O que valia numa semana, não valia noutra porque um bando de burocratas ficava somando números, desenhando gráficos, elaborando planilhas que decretavam o que se podia fazer nesta ou naquela região. E as coisas preteavam, avermelhavam, alaranjavam-se, amarelavam.

         Quem ia duma cidade a outra nunca sabia  ao certo o que iria encontrar, em termos de restrições, pois cada prefeito tem o superpoder de, ele também, ordenar maior ou menor restrição.

         Mas 2020 é ano de eleição e o Corona sempre soube disso. Assim, planejou seus ataques mais, desculpem o trocadilho, virulentos, para os meses iniciais do ano, diminuindo, à medida que se aproxima o dia 15 de novembro.

         Pois nessa semana de dois a seis de novembro, não é que, o Rio Grande do Sul, que chegou a ter, se não estou enganado, em algumas semanas, todo o território sob bandeira vermelha, agora só tem uma, a de Santa Rosa.

         Vírus estranho esse. Tomado dum sentimento cívico extraordinário. Tanto que, a continuar desse jeito, até o dia 15 de novembro, pega suas trouxas e vai cantar em outra freguesia.

         Acredito, cientificamente, que já está descoberta a vacina contra o Corona: a mera realização de eleições.

         Toda a vez em que os casos aumentarem, a realização dum simples plebiscito, referendum, eleição para síndico, governador, deputado, etc., vai fazer com que os casos, miraculosa e cientificamente diminuam ou desapareçam para todo o sempre, amém.

         Critérios da Ciência ...

         Quanta vergonha devem estar sentindo os verdadeiros cientistas ao verem a cafajestice usando esse ramo do conhecimento como justificativa de inescrupulosas politicagens.

         Para finalizar, uma pergunta: por que o idoso ou participante de grupo de risco não é dispensado de votar e é impedido de tantas outras atividades? Por que não pode frequentar um restaurante, mas pode entrar em filas, assinar em planilha que muitos outros contaminaram antes, tocar em botões muitas vezes tocados?

         Se o passar álcool gel é tão seguro assim, então que se volte à normalidade. Basta lavar as mãos ou passar o miraculoso líquido e o Corona embarca no primeiro avião e volta para a China, donde não deveria ter saído.

         Agora sim, finalizo alertando: preparem-se para a "segunda onda", que retornará, por critérios científicos, após as eleições, com endurecimento da liberação de atividades.

         E não digam que não avisei.