domingo, 19 de março de 2023

Como Multiplicar os Litros de Gasolina

 

                      Ainda sem comprovação científica, mas há indícios de que a raça de inseto que mais vive de teimoso é a de gubernator aeroplani - piloto, em latim, nobre leitor.

            Não surgiu Universidade renomada que tenha patrocinado a pesquisa para provar que determinada classe de humanus pertinax continua vivendo apesar das inúmeras tentativas que os membros da raça fazem para encurtar seus "curtos dias na Terra que o Senhor Deus lhes dá" ...  

            Mas se existe algum recém-formado que ainda não tem ideia da tese a defender, aqui fica a sugestão: "Prolongamento da Vida Através do Emprego Reiterado da Teimosia".

            E o paradigma aconselhado é o gubernator aeroplani pertinax.

            Não adianta, essa raça parece que quanto mais tenta, menos consegue realizar seu sonho de voar noutras  dimensões.

            Os católicos são devotos de Nossa Senhora do Loreto. Os seguidores de outras religiões também têm seus protetores e, acredito, todas as crenças afirmam que cada ser humano tem um anjo protetor que se encarrega de cuidar para que o mal não atinja seu protegido.

            Os que mais trabalham são os protetores de quem voa.

            Se fosse possível falar com esse pessoal, quase certamente descobriríamos que aqueles encarregados de zelar pela integridade dos pilotos, ao descobrirem sua missão, com certeza apelaram enfaticamente ao chefe para fazer uma troca, a fim de que fossem lotados noutra repartição ...

            Que motorista de avião é uma racinha que dá trabalho, ah, isto é ...

            Uns gostam de provocar a natureza se enfiando em condições meteorológicas mui brabas, outros adoram se exibir para a namorada, há os que são desafiadores de limites, cada vez chegando mais perto do lado de lá do limite, existem os acrobatas sem preparo, os inexperientes presunçosos, enfim, uma lista de gente que vive procurando, procurando e, felizmente, nem sempre achando sarna pra se coçar.

            Mas volta e meia o anjo-da-guarda distraiu-se, adoeceu, teve dor-barriga, viu uma anja bonita, enfim, rateou no cumprimento do dever e lá se foi um membro da raça dos pertinax ...

            Apesar dessas eventuais perdas a grande verdade é que "piloto vive  de teimoso" porque, se para cada aprontação viesse a cobrança correta, estaríamos numa tremenda falta de mão-de-obra para motorista de objetos voadores.

            Quem de nós não andou perto da foice aquela? Quem já não pensou: "Essa foi por pouco"?

            Pois lhes contarei uma involuntária aprontação que, por pouco não envia a mim e ao outro piloto ao prematuro Juízo Final.

            Este escrevinhador tinha que fazer uma navegação topetuda para a Região Sul do Rio Grande, com sobrevoos de visualização de diversas áreas, afastando o aviãozinho da rota seguidamente, o que, obviamente, exigia mais tempo de voo e combustível para permanecer lá no alto.

            Decolamos, o Lagartixa - se não me engano e eu -  com os tanques cheios até as goelas, certos de que  a gasosa seria mais do que suficiente.

            Naquele tempo este "idoso" - pra não dizer velho - era um guri de trinta e sete anos e o Lagartixa era um piá que talvez nem vinte anos tivesse. Acontece que o gajo aqui, nem PP havia checado ainda porque entrei na aviação aos 34 anos. Estava terminando o curso, mas ainda não fora brevetado.

            O Lagartixa, ainda que já fosse piloto comercial, andava com sua experiência de menos de 150 horas, o que, convenhamos, não é assim, coisa de outro mundo ...

            Estava pronta a receita para uma eventual aprontação, mesmo que não intencional.

            Começamos a sobrevoar umas áreas logo depois de Guaíba, aproamos Tapes, mas o aproamos era apenas força de expressão. Era um tal de ziguezaguear duma propriedade para outra que, mal havíamos passado Barra do Ribeiro, já estávamos com mais de duas horas de voo, o que, em linha reta, devia dar uns quarenta  minutos.

            E assim fomos, curva à esquerda aqui, à direita ali, três meia zero lá adiante que, pra já, estávamos com três horas de voo. Beirava meio-dia, quando sobrevoamos a pista duma prima de meu amigo Marocco, a qual ficava bem pertinho da sede da fazenda.

            Claro que pousamos para uma desaguada e, por constrangimento, um convite para o almoço.

            Aliviados e de barriga reabastecida, lá nos fomos no rumo de Camaquã onde pousamos na pista do Ernani Mello (Antiga Aeroagrícola Sotriar).

            Bem, sempre anotando o tempo de voo transcorrido no tanque direito, tanque esquerdo, reinício do voo depois de cada pouso e mijada.

            Mesmo assim, dali a pouco o Lagartixa começou a incomodar com a preocupação referente ao combustível.

            - Tchê, fica frio, tô anotando tudo, mal passamos das três horas. Daqui a São Léo é um pulo - coisa de cinquenta minutos. Vamos chegar lá com combustível que dá pra voltar aqui.

            Ao que ele retrucou:

            - Mas a impressão que tenho é de que voamos bem mais do que isso.

            - Tu tá é muito impressionável! Toca ficha e vamos voar mais uns trinta minutos ali por perto de Arambaré, depois voltamos "só o risco e o fedor", direto, sem ziguezague, na maior tranquilidade.

            - Mas Barbosa, tu tens certeza de que estamos só com três horas e pouco. Olha os mostradores de gasolina. Estamos quase no vermelho.

            Insisti e ele concordou em ir até a beira da Lagoa dos Patos.

            De lá aproamos as casas.

            O Lagartixa, entretanto,  vinha nervoso.

            Os ponteiros de ambos os tanques entraram no vermelho de verdade.

            Quando chegamos no Aeroclube o pessoal já estava de olho arregalado, pois o tempo desde a decolagem era muito superior à autonomia do valente Cherokee 140.

            - Fiquem frios, temos ainda muita gasolina nos tanques. Acontece que pousamos pra churrasquear numa amiga e para desaguar numa outra pista agrícola. Estamos com apenas quatro horas e pouco de voo.

            O sistema do Aeroclube era de que todo o piloto que chegava dum voo tinha obrigação de reabastecer a aeronave, pois se houvesse necessidade dum voo urgente e não programado, não se perderiam preciosos minutos com reabastecimento.

            E nos fomos para a bomba a fim de encher os tanques.

            Pois não é que quase esvaziamos o reservatório do Aeroclube ...

            Resumindo: a gente tinha gasosa para mais uns quinze minutos de voo e, olha lá.

Com mais um tempinho voando e, pela rota de retorno, estaríamos em pane seca bem em cima da área urbana de Sapucaia ou São Leopoldo, com todos os riscos e possibilidades de zebra em pouso forçado sobre áreas construídas.

            O aprendiz de piloto aqui tinha se atrapalhado  nos cálculos. Quem fez curso nos idos de antigamente, sabe daquela história dos minutos que se transformam em horas na soma dos tempos.  Nada desses celulares e aplicativos frescotiados que calculam tudo pra ti. Pois nessa transformação  eu comera uma hora inteirinha...

            Em vez das quatro horas, ponto dois, chegáramos com cinco horas e dois décimos sem nenhum reabastecimento ...

            Conseguimos convencer o instrutor-chefe a não levar o ocorrido para conhecimento dos superiores. Seria "gancho" certo de dois ou três meses sem poder voar ou, quem sabe, até um convite para ir voar em outras plagas ...

            Dizem que o relatório dos anjos-da-guarda  exigiu adicional de horas extras e periculosidade por ter que voar junto com os dois gubernator aeroplani pertinax, que eram, das duas uma: loucos de atirar pedra ou burros que nem  certa presidenta duma republiqueta da América Latina ...

        


      Aqui o mesmo aviãozinho em Santa Cruz do Sul, numa aventura

bem mais light, onde tudo correu dentro dos conformes. 

            18 de março de 2023.


   Se você tem um "causo" engraçado, uma história séria, uma aventura para contar, manda para o Barbosa Lambe-Lambe,  que ele enfeita, mas não inventa e publica. 

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Por Isto é que os Anjos da Guarda de Pilotos Querem Adicional de Periculosidade


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Humor

   Piloto de Cirrus avaliando as condições meteorológicas para voo.

   Atentar para o que acontece quando vem o relâmpago ... !!!




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sábado, 11 de março de 2023

 

                               Pouso Arriscado e Decolagem Perigosa

 

            Pois andava o "Lambe-Lambe" retratista - conforme sempre diz o Jader Dutra, de São Gabriel - fazendo seus "retratos" lá na fronteira com a Argentina, Uruguaiana, para ser mais exato.

            Fui muito bem recebido pelo Fernando, da Aeroagrícola Pampiana (e o correto é com i, mesmo), que, além de ceder hangar, sempre que possível me passava informações sobre clientes interessados em fotos aéreas.

            Um belo dia me chamou no seu escritório e apresentou um representante de insumos agrícolas que conhecia muito bem os principais granjeiros de Uruguaiana, com a localização de suas propriedades, fones de contato, etc.  Pena que  não lembre mais do nome dele, pois foi duma gentileza desinteressada a toda a prova. Passou informações valiosíssimas para meu trabalho e, chegando ao hotel, taquei-me a programar uma rota de voo.

            Informou ele, inclusive, posição de algumas pistas, caso fosse necessário  pouso por pane ou simplesmente uma desaguada.

            Tal voo coincidiria com o retorno do Kitfox para a pistinha em São Vicente do Sul, onde me escondo dos cobradores.

            Assim, caprichei no estabelecimento da devida rota, partindo de Uruguaiana, fotografando muitas propriedades antes de Alegrete e, depois, seguindo para as casas.

            No dia seguinte, condições favoráveis, me mandei aos céus, seguindo os pontos programados na rota.

            Lá pela posição 12 acho eu, o GPS enloucou por completo e apontou o próximo objetivo a uns 13.000 km de distância. Achei que fosse uma simples troca de Norte por Sul, corrigi, mas não deu certo. Apareceu um outro lugar no hemisfério Sul, mas a quase 5.000 km. Como a posição era duma fazenda em que o amigo  informante tinha como certa uma boa venda de fotos, não quis perdê-la e optei pelo pouso na pista da granja que estava sobrevoando naquele momento, para, com calma refazer a rota. Felizmente ele me informara que a pista era bem próxima da sede.  Foi pra já que a localizei e, como fosse ainda época de safra parti do "supositório" que estava plenamente operante, sem fazer o tradicional voo rasante para conferir o piso, obstáculos, essas coisas.

            Alinhei com o eixo da pista e me vim.

            Não sei como a aproximação me deu ideia de uma pistinha perfeitamente normal, sem buracos, cocurutos, essas coisas.

            O Kitfox e eu nos fomos para o toque.

            O primeiro contato com o planeta Terra até não foi ruim, mas, mal correra uns 50 m, começam a aparecer macegas e outras capoeiras, coisa de quase metro ou, esporadicamente, até mais.

            "Se dou manete aqui, a hélice em alta, qualquer haste um pouco mais encorpada faz um baita estrago. Não tem jeito: vou cortar o motor e ver o que acontece."

            Como diria o Jânio Quadros: "Cortei-lho".

            E fiquei no aguardo da pilonagem no meio daquele macegal brabo, pois o Kitfox era de trem convencional, levezinho, portanto, com todos os ingredientes necessários a uma cacaca das boas.

            Pois não é que a capoeirama só serviu para encurtar o pouso, sem qualquer dano ao teco-teco?

            Fiquei uma arara com o dono da granja: onde já se viu, em plena safra deixar uma pista naquele estado? Esgotei o estoque de nomes feios, horrorosos, ofensivos, xingantes.

            Bom, agora é aguardar que alguém da granja apareça, para estudarmos um meio de tirar o teco dessa sujeirama de inço.

            Ninguém apareceu.

            Piloto é raça de bicho impaciente: já comecei a tentar um plano infalível para sair dali voando.

            Mas como?

            Sair roçando aquela capoeira toda com a hélice, no barato, poderia me trincar sua ponta  (de fibra) ou, pior, arrancar fora um pedaço dela, desbalancear o conjunto, podendo até arrancar o motor do berço.

            Também havia a possibilidade de aparecer uma touceira mais resistente que me travasse uma ou duas rodas, com pilonagem ou perda de reta. Que sinuca de bico!

            Não, concluí, por ali não daria para decolar de jeito nenhum. Plano A fora de cogitação. Só que não tinha plano B ou C.

            Ao lado da pista havia uma valeta de drenagem, para evitar alagamento nas épocas de chuva. Não sei por qual motivo, paralela a esta vala havia uma trilha de trator que era tão larga quanto a distância entre os pneus. Por algum motivo não havia macegal nesta estreitíssima trilha, por uns 90 metros. Como já tirei o Kitfox do chão em até 60 m, de teimoso  e louco para fazer merda, resolvi arriscar. Seria o plano infalível B ...

            Tive que tirar o teco da "pista-brejo" no muque e levá-lo à cabeceira da improvisada, larga e comprida pista para decolagem.

            Ah, não esquecendo que, mesmo com o baita susto, comecei a matutar em como restabelecer a rota inicialmente programada.

            Aí veio o estalo: "Mas tu és mui burro hein, Barbosa? Era só ignorar a posição problemática, passar para a seguinte e nada disso teria acontecido". Até porque era quase provável o contato visual da fazenda mal lançada na rota, entre as duas posições corretas, se é que me entendem.

            Deixei o tequinho bem alinhado, com a bequilha na macega e a hélice na área limpa, encompridando ao máximo a pista. Dei uma última conferida a pé, se não havia nenhum buraco, haste mais resistente e parti pro tudo ou nada, doutrinando-me, "se for perder a reta, perde pro lado das macegas, nunca pro lado do valetão."

            Entrei na "espaçosíssima" cabine, ajustei bem os cintos, botei o surrado capacete azul, de mil novecentos e antigamente, chequei bem os solados dos tênis que calçava, para ver se não havia umidade ou sujeira que atrapalhassem, freei o teco, dei perto de setenta por cento da manete e, quando o bichinho começou a arrastar as rodinhas, liberei os alicates, fui ao fundo da manete e nos fomos.

            Nem sei a quantos metros das capoeiras decolamos. Só sei que decolamos.

            Aviãozinho bom, o Kitfox: aceita cada piloto ...

            Ah, por dever de justiça: o dono da granja era mui caprichoso e já fazia dois anos que fizera outra pista, com perfeita manutenção, abandonando aquela, por estar em área muito alagadiça.

            Foi eu decolar da desativada que logo avistei a nova, pois ficara oculta pelas árvores ao redor da sede.

            Outra coisa: o cagaço valeu a pena pois saiu o brique.

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PARAQUEDAS SALVA







Perto de Belo Horizonte. Ninguém se feriu.


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DIA INTERNACIONAL DA MULHER


   Uma delas saltando de asa delt a partir dum balão.
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domingo, 5 de março de 2023

Sequestrador por um Dia

 

            Sequestrador por um Dia

 

            Este escrevinhador entrou na foto aérea lá nos idos de 1984, sou velhito, portanto, e meus primeiros voos foram no Aeroclube de Santa Maria.

            Como se sabe, o uso de aeronaves de aeroclubes ou não homologadas para fotos (SAE - Serviços Aéreos Especiais - na época) era e, acho, ainda é proibido. Mas, na peladura em que andavam os aeroclubes na época (talvez ainda andem), eram forçados a fazer uns panoramiquinhos, fotos, translados, para conseguir equilibrar o caixa. Falava-se à boca pequena que o DAC sabia, mas fazia vista grossa para que não houvesse uma quebradeira das escolas civis de aviação da época - os aeroclubes. Tudo pode ser fofoca de quem não tinha o que fazer ou falar ...

            Diga-se por dever de justiça que meu primeiro voo foi com o grande comandante Leonardo Kaczmarck, que por aqueles tempos era instrutor e estava com o pé no estribo para fazer o CAVAG. Tive sorte, pois nunca voara em avião pequeno e tinha receio de fazer fiasco, vomitando ou passando mal, como acontece seguidamente com fotógrafos desavisados. Ele, com aquele seu jeito calmo,  transmitia tranquilidade e segurança ao retratista já na entrada no Cessninha 140 - o famoso BBX. E, experiente, não fez curvas de alta, subidas e descidas rápidas. Foi um voo excelente, fotos boas e negócios melhores, pois fotos aéreas rendiam uns pilas na época.

            Como sou natural de Santa Maria e a família tem uma Chácarazinha em S. Vicente do Sul, continuei o trabalho na região e como o Leonardo já se bandeara para a aviação agrícola, voei com vários outros pilotos, inclusive o personagem de hoje.

            Passara este "Lambe-Lambe" um bom intervalo sem voar na região e quando voltei o pessoal no Aeroclube era outro. Ninguém me conhecia, mas, por necessidade, aceitaram fazer o panorâmico e o dito instrutor foi preparar o Cessna 172 para a gente ir para as bandas de Quevedos, Jari, Tupanciretã, meio caminho andado no rumo do Paraguai.

            O escrevinhador agora já tinha experiência e, se não me falha a memória nem me pisca a vista, já estava fazendo o PP em São Leopoldo. Mas o comandante do voo não sabia disto e eu não passava dum estranho. Sou meio de venetas e, num dia falo pelas tripas do Sujeito Aquele, noutro estou quieto, feito criança cagada (bipolar, segundo os analistas de Bagé ...).

            Pois aquele era meu dia Zen, reflexivo.

            Um sujeito estranho, caladão, com uma pochete suspeita atravessada na cintura e mais uma bolsa que, informara ele, trazia câmaras e filmes. Tal pochete realmente, para quem não é fotógrafo é mui estranha: nela cabe uma lente 70-200mm, uma câmara com lente normal, filmes, etc.  Dá, tranquilamente para levar um tresoitão, cano médio sem levantr suspeita.

            Mas pro comandante, levantou suspeita, ainda mais que a proa era pro Paraguai.

            Decolamos.

            O sujeito devia já estar borrado e pensando: "Bem que eu podia retornar à Base Aérea e solicitar uma revista dessa bagagem. Se faço, e não for nada demais, entrego o Aeroclube por voo proibido, perco a vaga de instrução, são capazes de aplicar uma interdição e a bagunça está bem feita. Vou ter que arriscar".

            Eu às voltas com fotos, planejamento, marcação de posição para posterior visita ao fazendeiro, granjeiro, dono de posto, etc.

            O encagaçado comandante quieto, suando, louco para voltar, pois não estava acostumado com fotos aéreas em série, quando se vai fotografando tudo que é estabelecimento, obra, cidade, etc.

            - Já não está na hora de voltar? - perguntou, tremendo a voz.

            - Não, recém estamos no início. Até aqui é região que conheço e são fotos já encomendadas. Vamos começar novo setor, aproando um pouco mais para oeste. Esse um pouco mais para oeste foi quase a gota dágua para borrar as cuecas do homem. Era o caminho mais curto para a fronteira com o Paraguai.

            E veio a gota dágua:

            Saquei da pochete um objeto preto, borda superior arredondada, que deixava apenas aparecer o cano, pois o cabo a mão encobria.

            "Este filho duma égua vai me sequestrar. Ninguém traz pistola prum voo de foto."

            E pediu proteção a Nossa Senhora do Loreto: "Por favor, me livra desta. Sou jovem, iniciando carreira de piloto. Não mereço virar um defunto abandonado numa pista clandestina dos contrabandistas paraguaios!"

            A invocada atendeu na hora e ouviu-se uma voz salvadora:

            - Foto golf trinta e quatro: fazenda com mangueiras e piscina, à esquerda da estrada de Quevedos a Jari.

            Era eu falando ao minigravadorzinho, que para o borrado piloto tinha parecido um Lugger, Taurus ou qualquer outra fatal pistola ...

            Naquele tempo o GPS não era usado corriqueiramente e descrever os locais fotografados era o melhor jeito de se contatar com os proprietários para oferecer os "retratos".

            O cueca borrada evoluiu, também fundou uma empresa de aviação agrícola: nome do índio - Ledo Paulo Rosa, grande parceiro.

            Dizem que descobriu uma fórmula mágica de sanitização de assentos de Cessna, onde cheiro de merda transforma-se em perfume ...

            A gente aumenta, mas não inventa.

            O referido é verdade e dou fé.

            Palma, 05 de março de 2023