Pouso Arriscado e Decolagem Perigosa
Pois andava
o "Lambe-Lambe" retratista - conforme sempre diz o Jader Dutra, de
São Gabriel - fazendo seus "retratos" lá na fronteira com a Argentina,
Uruguaiana, para ser mais exato.
Fui muito
bem recebido pelo Fernando, da Aeroagrícola Pampiana (e o correto é com i,
mesmo), que, além de ceder hangar, sempre que possível me passava informações
sobre clientes interessados em fotos aéreas.
Um belo dia
me chamou no seu escritório e apresentou um representante de insumos agrícolas
que conhecia muito bem os principais granjeiros de Uruguaiana, com a
localização de suas propriedades, fones de contato, etc. Pena que
não lembre mais do nome dele, pois foi duma gentileza desinteressada a
toda a prova. Passou informações valiosíssimas para meu trabalho e, chegando ao
hotel, taquei-me a programar uma rota de voo.
Informou
ele, inclusive, posição de algumas pistas, caso fosse necessário pouso por pane ou simplesmente uma desaguada.
Tal voo
coincidiria com o retorno do Kitfox para a pistinha em São Vicente do Sul, onde
me escondo dos cobradores.
Assim,
caprichei no estabelecimento da devida rota, partindo de Uruguaiana,
fotografando muitas propriedades antes de Alegrete e, depois, seguindo para as
casas.
No dia
seguinte, condições favoráveis, me mandei aos céus, seguindo os pontos
programados na rota.
Lá pela
posição 12 acho eu, o GPS enloucou por completo e apontou o próximo objetivo a
uns 13.000 km de distância. Achei que fosse uma simples troca de Norte por Sul,
corrigi, mas não deu certo. Apareceu um outro lugar no hemisfério Sul, mas a
quase 5.000 km. Como a posição era duma fazenda em que o amigo informante tinha como certa uma boa venda de
fotos, não quis perdê-la e optei pelo pouso na pista da granja que estava
sobrevoando naquele momento, para, com calma refazer a rota. Felizmente ele me
informara que a pista era bem próxima da sede.
Foi pra já que a localizei e, como fosse ainda época de safra parti do "supositório"
que estava plenamente operante, sem fazer o tradicional voo rasante para
conferir o piso, obstáculos, essas coisas.
Alinhei com
o eixo da pista e me vim.
Não sei como
a aproximação me deu ideia de uma pistinha perfeitamente normal, sem buracos,
cocurutos, essas coisas.
O Kitfox e
eu nos fomos para o toque.
O primeiro
contato com o planeta Terra até não foi ruim, mas, mal correra uns 50 m,
começam a aparecer macegas e outras capoeiras, coisa de quase metro ou,
esporadicamente, até mais.
"Se dou
manete aqui, a hélice em alta, qualquer haste um pouco mais encorpada faz um
baita estrago. Não tem jeito: vou cortar o motor e ver o que acontece."
Como diria o
Jânio Quadros: "Cortei-lho".
E fiquei no
aguardo da pilonagem no meio daquele macegal brabo, pois o Kitfox era de trem
convencional, levezinho, portanto, com todos os ingredientes necessários a uma
cacaca das boas.
Pois não é
que a capoeirama só serviu para encurtar o pouso, sem qualquer dano ao
teco-teco?
Fiquei uma
arara com o dono da granja: onde já se viu, em plena safra deixar uma pista
naquele estado? Esgotei o estoque de nomes feios, horrorosos, ofensivos,
xingantes.
Bom, agora é
aguardar que alguém da granja apareça, para estudarmos um meio de tirar o teco
dessa sujeirama de inço.
Ninguém
apareceu.
Piloto é
raça de bicho impaciente: já comecei a tentar um plano infalível para sair dali
voando.
Mas como?
Sair roçando
aquela capoeira toda com a hélice, no barato, poderia me trincar sua ponta (de fibra) ou, pior, arrancar fora um pedaço
dela, desbalancear o conjunto, podendo até arrancar o motor do berço.
Também havia
a possibilidade de aparecer uma touceira mais resistente que me travasse uma ou
duas rodas, com pilonagem ou perda de reta. Que sinuca de bico!
Não,
concluí, por ali não daria para decolar de jeito nenhum. Plano A fora de
cogitação. Só que não tinha plano B ou C.
Ao lado da
pista havia uma valeta de drenagem, para evitar alagamento nas épocas de chuva.
Não sei por qual motivo, paralela a esta vala havia uma trilha de trator que
era tão larga quanto a distância entre os pneus. Por algum motivo não havia
macegal nesta estreitíssima trilha, por uns 90 metros. Como já tirei o Kitfox
do chão em até 60 m, de teimoso e louco
para fazer merda, resolvi arriscar. Seria o plano infalível B ...
Tive que
tirar o teco da "pista-brejo" no muque e levá-lo à cabeceira da
improvisada, larga e comprida pista para decolagem.
Ah, não
esquecendo que, mesmo com o baita susto, comecei a matutar em como restabelecer
a rota inicialmente programada.
Aí veio o
estalo: "Mas tu és mui burro hein, Barbosa? Era só ignorar a posição
problemática, passar para a seguinte e nada disso teria acontecido". Até
porque era quase provável o contato visual da fazenda mal lançada na rota, entre
as duas posições corretas, se é que me entendem.
Deixei o
tequinho bem alinhado, com a bequilha na macega e a hélice na área limpa,
encompridando ao máximo a pista. Dei uma última conferida a pé, se não havia
nenhum buraco, haste mais resistente e parti pro tudo ou nada, doutrinando-me, "se
for perder a reta, perde pro lado das macegas, nunca pro lado do valetão."
Entrei na "espaçosíssima"
cabine, ajustei bem os cintos, botei o surrado capacete azul, de mil novecentos
e antigamente, chequei bem os solados dos tênis que calçava, para ver se não
havia umidade ou sujeira que atrapalhassem, freei o teco, dei perto de setenta
por cento da manete e, quando o bichinho começou a arrastar as rodinhas,
liberei os alicates, fui ao fundo da manete e nos fomos.
Nem sei a
quantos metros das capoeiras decolamos. Só sei que decolamos.
Aviãozinho
bom, o Kitfox: aceita cada piloto ...
Ah, por
dever de justiça: o dono da granja era mui caprichoso e já fazia dois anos que
fizera outra pista, com perfeita manutenção, abandonando aquela, por estar em
área muito alagadiça.
Foi eu
decolar da desativada que logo avistei a nova, pois ficara oculta pelas árvores
ao redor da sede.
Outra coisa:
o cagaço valeu a pena pois saiu o brique.
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PARAQUEDAS SALVA
DIA INTERNACIONAL DA MULHER
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