Como na primeira vez em que o Deoclécio, Peão Voador do Alegrete entrou no blog, suas aventuras foram seguidas com extrema ansiedade pelos meus cinco leitores, achei por bem relançar algumas de sua peripécias já passadas, conhecidas e esquecidas, prometendo dar continuidade com suas novas aprontações.
Chamo a atenção para este capítulo em especial, pelos motivos a seguir expostos - expressão do juridiquês que uso só para provar que ainda não esqueci de um tudo o que me ensinaram no Curso para Advogado de Porta de Cadeia.
Deoclécio, o Peão Voador
Pois como faz um certo tempo que o Deoclécio não comparece com suas
aventuras, esclareço que no capítulo anterior o índio estava em pleno primeiro
vôo solo, no circuito de tráfego, gritando, louco de faceiro, com sua
realização ...
Foi
quando a enfermeira, apavorada, ouviu aqueles gritos de "Qui - bi - bi - u
- uh - uh!!!!!!!!".
Entrou
correndo no quarto e encontrou o Deoclécio, olhos arregalados, banhado em suor,
rebolqueando-se na cama.
Devia
ser o febrão, coisa de quase 41 graus e o peão beirava o estado convulsivo.
O
médico-plantonista foi chamado às pressas e, vendo a gravidade da situação,
ordenou que o doente fosse imediatamente colocado numa banheira de gelo, a fim
de baixar a febre, ainda que houvesse o risco de complicar-se a
"gripe-do-porco".
O índio
já conquistara a bem-querença de enfermeiras, médicos e pacientes. Por isso
todos acompanhavam com apreensão o estado de saúde do futuro piloto. Queriam
ver o amigo bom de vereda.
Mas o
causo era encardumado. Deoclécio era um dos raros pacientes maduros em que a
gripe agia com tanta virulência. Aquele remédio afrescoteado que o governo
comprara em grande estoque não fazia nem "cosca" no organismo do
homem.
O jeito
era confiar na resistência do gaudério, que os remédios somente serviam para
tapear os sintomas da gripe.
A prenda
Cláudia não desgrudava da cabeceira. Emagrecia a olhos vistos e nem assistia às
aulas da faculdade, muito menos as do Curso de Piloto Privado. Estava com umas
olheiras de dar pena.
Pela
cidade corria a notícia de que o peão que estava aprendendo a voar beirava a
morte, vitimado pela gripe vinda das bandas de Paso de Los Libres, na
Argentina, via Uruguaiana, cidade de intenso movimento de caminhoneiros. Esses
caminhoneiros vivem cruzando entre Brasil, Argentina e Chile e, podiam, muito
bem, servir como agentes transmissores do vírus. Um deles até passava mal num
hospital da cidade fronteiriça.
Um grupo
de solteironas beatas, sabedoras dos, digamos, dotes do gaúcho, fazia vigília,
rezando vinte e quatro horas por dia pela pronta recuperação do piloto. Sabem
como é, a esperança é a última que morre e elas alimentavam a esperança de não
partir desta para melhor sem o gostinho, ou seria, gostão ...
Nas
aulas do Curso o assunto era o estado de saúde do peão.
- Que
graça vai ter, a gente ser aprovado na banca não ter o Deoclécio junto? - dizia
um.
- As
tiradas do taura, seu jeitão direto e as ganhadas dos instrutores, isso está
fazendo muita falta - acrescentava outro.
O fato é
que a saúde do Deoclécio era o assunto do momento e até a Rádio principal da
cidade, todos os dias falava sobre a evolução do tratamento.
Com o
tratamento emergencial do mergulho no gelo, o homem baixou a febre, mas havia o
risco de estar contaminado pela super-bactéria, além do vírus gripal.
O caldo
ameaçava entornar e havia o risco bem real do Deoclécio esticar as canelas.
Seria
uma perda para o Alegrete e o mundo
aeronáutico.
Pessoas
que liam o blog dum tal de Barbosa, enviavam os votos de recuperação, a partir
do lugares mais longínquos, por exemplo, Vietnã, Japão, Malásia, Estados
Unidos, Ilhas dos Açores, etc.
Parecia
até que era o candidato a presidente que estava doente.
De volta
ao quarto, o doente ficou num estado de letargia e os médicos resolveram
aplicar um calmante, para que ele economizasse energias e as aplicasse
unicamente no combate ao vírus e possível bactéria.
Com soro
no braço, alguns quilos mais magro, cor de doente, não era nem sombra do
cavaleiro ereto que montava pelos pampas há poucos dias.
A
corrente pró-recuperação do Deoclécio não se interrompia e ganhava adeptos a
cada hora. O padre, sem cobrar nada, resolveu rezar missa pelo índio. Pastores
evangélicos incluíam o doente nas orações em seus cultos. Umbandistas faziam
passes. Velhos, adultos, jovens, crianças, todos queriam que o peão realizasse
o seu maior sonho - voar pelos pampas.
No mais
profundo de seu inconsciente o peão sabia que não se morre sem peleia. Botou
cada célula, cada vaso sangüíneo, cada nervo e músculo a lutar pela vida.
- Se
nunca desparei de adaga, me assustei com rodada feia, revólver, facão, dois ou
três contra um, havéra de se vê se vô me entregá pruns micóbrio? Eles que me esperem!
- delirava.
Entre as
lágrimas, a Claúdia tinha que largar um riso amarelo, com as tiradas do peão.
Ainda
havia luta.
Era ele
um Farrapo, em plena revolução, numa carga de cavalaria, indômito, invencível,
encarando a morte de frente, mas nunca pensando em entregar a rapadura.
- E tem
mais, só morro adespoi de confirmá o solo! Antes disso, nem que a vaca tussa!
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E agora? Morre o peão? Mata os "micóbrio"?
Acesse o blog na semana que vem ...
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PENSAMENTO DO DIAZ:
Voar é a melhor coisa do mundo; pousar é melhor ainda!!!
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