Depois daquele
desentendimento que tive com a cerca, detonando o “Kitfox”, por falta de pilas
tive que vender o aviãozinho, mesmo acidentado, a preço de banana, que foi a
oferta que apareceu.
Resumindo,
o Fábio, instrutor em Gravataí, na Aldeia dos Anjos, pagou o motor Rotax 912 e
levou junto o resto, como cortesia ... Mas, a bem da verdade, comprou com o
motor trancado, sem saber o que podia ter por dentro. Felizmente, nada sério, o
motorzinho havia sofrido um calço mecânico, pela excessiva carbonização.
E
como é que eu iria adivinhar que num motor de quatro tempos, com TBO prevista
para 1000 horas, devesse fazer descarbonizações, dependendo da freqüência de
uso, com apenas 150 horas, para o caso de quem voasse com intervalos muito
grandes? Como já estava com 560 horas, sem uma única descarbonização, usando
uma gasolina, que é, digamos, uma m ..., deu isto mesmo ...
Eu
e o meus parênteses ... Isso detona o meu estilo, se é que existe algum. E aí
veio outro ...
Logo
após a venda do Kitfox, o melhor aviãozinho leve em que já tive o prazer de
voar, fiquei, como diz o gaúcho: “de a pé”, por uns meses.
Lá
pelas tantas consegui comprar o “Pober Pixie” “construído” pelo dentista Saffer, com assessoria
(ortopedística) Paulo Machado, e que naquela época estava nas mãos do
anestesiologista Régis, também conhecido como Grumatã ... E por que é que há
tanto médico na aviação?
A
estas alturas a tesão por voar novamente num aviãozinho próprio saltava pelas orelhas. A ansiedade também era
proporcional a esta tesão, o que, normalmente, não dá bom resultado.
Já
havia feito um voozinho de teste em São Leopoldo, mas fora apenas turno de
pista. Quem levara o aviãozinho para Montenegro fora o próprio Régis.
Assim,
no dia em que fui lá fazer meu primeiro vôo, você não imaginam a ansiedade por
estar no ar, de novo, numa aeronave minha.
Havia
feito umas modificações no pára-brisa e também queria testar as reações
aerodinâmicas com elas, antes de sair para vôos mais longos.
Os
pneus estavam um pouco murchos e no hangar do Régis e colegas da aviação experimental não havia compressor de ar.
Teria, então, que ir ao hangar do aeroclube para calibrá-los.
Saí
“dando dezoito em terra lavrada”, expressão gaúcha para cavalo bom, que faz em
dezoito segundos algo ao redor de um quarto de milha: mas, ao aproximar-me do
hangar do Aeroclube, esqueci que havia chovido um monte, que a pista estava
encharcada, especialmente nas laterais e, em vez de seguir cuidadosamente o
acesso ao pátio de estacionamento, saindo da pista a noventa graus, fui pelo
atalho e enfiei o Pober Pixie na banhado.
As
rodinhas se enterraram no barro e a pilonagem
foi suave e parcial, com o aviãozinho de nariz enterrado, sem maiores
danos, aparentemente.
A
gasolina derramando do tanque e o pessoal com medo de chegar perto para me
ajudar, temendo o fogaréu. E o “Pobre Bicho” em posição pouco cristã, de bunda
erguida ...
Lá
pelas tantas, como o fogo não veio, o Wagner, então presidente do aeroclube e
mais um curioso que andava por lá vieram me ajudar. O tal curioso veio com uma
garrafa de cerveja numa das mãos e um cigarro aceso nas outra. Ao aproximar-se
para ajudar, largou a garrafa, mas não o cigarro. E a gasolina derramando ...
Consegui
avisá-lo a tempo e o trabalho de resgate foi feito sem grandes imprevistos.
Examina
daqui, examina dali, apenas a proteção
metálica da ponta da hélice havia saído, ficando irrecuperável. Tentei
improvisar outra, mas o peso ficou diferente e desbalanceou-se o catavento...
O
remédio foi apelar para o Orley, em Ponta Grossa e pedir uma nova hélice com a
maior brevidade. Ele entendeu minha situação e, numa semana eu já tinha
ventilador novo no Pober Pixie.
A
pressa pelo vôo deu em nova cacaca.
Coloquei
a hélice em posição errada. Na hora da
partida manual além de exigir muito maior esforço, o giro não fechava bem com o
tempo de explosão, dificultando a ‘pegada’ do motor.
Deixo
assim, só por hoje e noutra hora coloco em posição certa, que hoje quero é voar
– pensei.
Na
posição normal, o Pober já era meio reinoso para pegar. Do jeito em que estava,
com a gente dando hélice com medo, havendo menos força no giro, a coisa
encrespou-se de vez: nada de Continetal 65 roncar.
Já
estava num baita suadouro, fazendo mil e uma experiências , ora desafogando o
motor, ora girando com a manete em posições diversas, etc.
Resolvi
partir para um método científico de acionamento: calcei o avião com umas pedras
pesadas e altas, para ter certeza de que não pularia os calços e dei hélice com
a manete toda reduzida: não pegou. Manete meio centímetro avançada: necas. Um
centímetro à frente: nem sinal. E,fui avançando milimetricamente. Movimentos
“friamente calculados”.
De
repente ...
O
Continental 65 em vez de roncar, berrou que nem terneiro de sobreano na
capação.
E
berrou valendo.
O
Pober Pixie do “causo” é monoplace, com o assento do piloto ligeiramente
recuado para que o peso do manicaca deixe o centro de gravidade na posição
correta. Como nesta “experiência sobre o que não se deve fazer” o piloto estava
“dando corda” na aeronave, já tínhamos um fator prejudicante. Dito piloto
deveria cabrar o manche, se estivesse dentro do avião. Como estava fora, que
pelo menos travasse os comandos corretamente, o que não fez. Outro item
entornador de caldo. A única coisa aparentemente correta, foram os calços
superdimensionados, para substituírem os freios, o que, ao final, contribuiu
decisivamente para o desandamento da
maionese ...
O
motor queria puxar o nariz do avião para a frente, os calços impediram, o
profundor estava solto e não havia peso no local certo para impedir que a cauda
se erguesse. Assim ...
Saltou
caco de hélice a mais de quarenta metros.
Depois
dessa acho que o meu recorde merece um lugar no Guiness: sem uma única hora de
vôo, em apenas sete dias, o grande piloto
destruiu duas hélices
Quando
liguei de novo para o Orley ele até pensou que fosse para reclamar de algum
problema. Contei-lhe o acontecido e até pensei em propor-lhe sociedade: a duas
hélices por semana para o mesmo avião,
duvido que ele arrumasse outro cliente igual ...
Por
consolo, restava a esperança de já tivesse gasto o estoque da cagadas a fazer,
devendo o primeiro vôo já estar sob a
conjunção aeronáutica do cuidado, da atenção e nada de pressa em voar ...
E
tudo foi uma beleza, tanto que ainda estou escrevendo, vivinho e sadio da
silva.
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Tá Perto
"Invite" Gaudério
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