segunda-feira, 22 de janeiro de 2024

A Utilidade dos Dedos

 

A Utilidades dos Dedos

 

                        Já pegara a mão do Netuno. Andava com ele para cima e para baixo todo confiante e acreditava que ele também confiava em mim. Saía com uns ventos ... e voltava.

 

                        Mas em 97 a bruxa andou se soltando. Um quebrava avião aqui, outro ali, e essas zebras levaram alguns  a largar o brinquedo.

 

                        A estas alturas me mandara para São Vicente do Sul, que fica a umas 50 milhas depois de Santa Maria, onde tem a Base Aérea. 

                       Lá hangarei o Netuno embaixo duns cinamomos e fiz alguns vôos pela região. Como as vendas não estivessem indo muito bem na região, resolvemos, eu e o mano Paulo, voltar de mala e cuia para a pista do Pacheco, em Gravataí.

 

                        Neste retorno houve um incidentezinho:

 

                        No momento em que eu decolava o Paulo saía com a Santana e o reboquinho, no apoio.

 

                        Acontece que eu ficara de tirar o retrato duma fazenda a uns dez minutos de vôo da pista e de lá seguir direto rumo à pista agrícola que havia em Novo Cabrais, bem ao lado da estrada e perto dum posto e lanchehria. Mas também aconteceu que esquecera de colocar meu regulador automático de temperatura do ar para o carburador. 

                    A engenharia era assim: um tubo flexível de uns 50mm tomava ar quente junto às aletas traseiras do cabeçote e conduzia o dito para a frente do carburador. Quando deixava o ar normal entrar livremente pela frente, como este fluxo era mais forte, naturalmente o ar quente não chegava à alimentação. Nos dias frios e úmidos, porém, era necessário colocar uma fita adesiva na tomada de ar, reduzindo em 90% sua abertura, de modo que a admissão puxasse o ar quente do tubo, em vez de só usar o ar gelado e úmido que criava gelo no carburador.

                 Com a falta de minha mufla tecnológica,  não deu outra: dali a pouco o velho Fuscão começou a tossir e se peidar. Como não sou de todo assustado e já sabia o que estava acontecendo, lá me fui para a Chácara, a fim de colar a tal fita. Entre ida e retomada de rota , uns vinte e tantos minutos jogados fora.  Pousei no campinho ao lado do Açude do Jacaré, subi a coxilha, peguei a fita, colei-a, mas reabastecer que era bom, nada, pois o combustível estava todo no reboquinho, a estas alturas já lá por santa Maria. Mesmo assim não desisti duma outra granja que queria sair bem na foto,  também  um pouco fora da rota.

 

                        Fui até a tal granja, retomei a rota, mas tinha um ventinho de proa, coisa pouca, mas que sempre segura  e alonga o tempo de vôo.

 

                        Passei São Pedro do Sul, onde sai o tradicional Encontro Gaúcho de Ultraleves, por Santa Maria com seus Xavantes e helicópteros Puma, já a estas alturas de olho na progressão do vôo e do consumo. Com o tanque adicional que pusera onde iriam os pés do carona, saíra na última decolagem com uns 45 litros. O consumo do Netuno era de 17 litros por hora. Tinha, assim, duas horas e quarenta minutos para chegar a algum lugar sem uma gota sobrando. O trajeto inicial previsto era duns 180 km. Isto significava, em circunstâncias totalmente favoráveis duas horas de vôo. Já queimara vinte minutos com  o retorno à pista, para “acionar o ar quente” o que já me levava para as duas horas e vinte minutos. O desvio de rota comera mais dez minutos, duas e meia. Tinha dez minutos para compensar vento de proa.

 

                        Os indicativos eram de que iriam sobrar minutos e faltar litros.

 

                        Falavam as más línguas que havia uma pista em Restinga Seca, mas que ninguém sabia em que estado estava. Se os Zurrilhos Sem  e/ou os Tatus Sem Terra não a tinham invadido, ninguém podia garantir. Além do mais, era mais um desvio e, caso a pista estivesse impraticável, aí mesmo a gasosa não daria para chegar na pistinha onde o apoio me esperava.

 

                        O que não tem solução, solucionado está: vamos ganhar uma alturinha, ficar sempre de olho num campinho pretensamente alternativo para um pouso ...

 

                        Fui até o que julguei a baba do tanque superior, cujo nível de combustível não conseguia ver direito e passei para o tanque inferior, onde visualisava direitinho a diminuição do preciosíssimo líquido.

 

                        Catei o mapa e medi os dedos que faltavam para chegar a Novo Cabrais. Também medi quantos dedos de combustível me restavam. A seguir apliquei um método rigorosamente científico de comparar dedos no mapa com dedos no tanque. A dedologia friamente calculada era implacável: somente a gasolina do tanque inferior não me levaria até lá. Quanto tínhamos em cima? Ninguém sabia. O jeito era pegar a rapa do tanque de baixo, passar para o superior e, na primeira tossida de ar, mudar de novo para o inferior e escolher o melhor pouso embaixo, questão duns quatro minutos de vôo.

 

                        Faltando meio dedo no mapa, lá se foi o tanque reserva. Passei para o normal e não sabia mais se olhava em frente ou se cuidava a primeira bolhinha de ar que passasse pela mangueira, a fim de acionar o reserva de novo, sem apagar o motor.

 

                        E nesse pavor fiquei até um quarto de dedo, já vendo a pistinha, mas sem ter a certeza de que lá chegaria.

 

                        Pois cheguei.

 

                        Começamos a pôr combustível. Parecia que os tanques estavam furados, pois não paravam mais de aceitar gasolina. Por mais uns cinco minutos de vôo, lá estaria eu mais uma vez pousado fora.

 

                        Fim do “Capítalo”

                     Segue na próxima postagem ...

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