A Utilidades dos Dedos
Já pegara a
mão do Netuno. Andava com ele para cima e para baixo todo confiante e
acreditava que ele também confiava em mim. Saía com uns ventos ... e voltava.
Mas
em 97 a bruxa andou se soltando. Um quebrava avião aqui, outro ali, e essas zebras levaram alguns a largar o brinquedo.
A estas alturas me mandara para São Vicente do Sul, que fica a umas 50 milhas depois de Santa Maria, onde tem a Base Aérea.
Lá hangarei o Netuno embaixo duns
cinamomos e fiz alguns vôos pela região. Como as vendas não estivessem indo
muito bem na região, resolvemos, eu e o mano Paulo, voltar de mala e cuia para
a pista do Pacheco, em Gravataí.
Neste
retorno houve um incidentezinho:
No
momento em que eu decolava o Paulo saía com a Santana e o reboquinho, no apoio.
Acontece que eu ficara de tirar o retrato duma fazenda a uns dez minutos de vôo da pista e de lá seguir direto rumo à pista agrícola que havia em Novo Cabrais, bem ao lado da estrada e perto dum posto e lanchehria. Mas também aconteceu que esquecera de colocar meu regulador automático de temperatura do ar para o carburador.
A engenharia era assim: um tubo flexível de uns 50mm tomava ar quente junto
às aletas traseiras do cabeçote e conduzia o dito para a frente do carburador.
Quando deixava o ar normal entrar livremente pela frente, como este fluxo era
mais forte, naturalmente o ar quente não chegava à alimentação. Nos dias frios e
úmidos, porém, era necessário colocar uma fita adesiva na tomada de ar,
reduzindo em 90% sua abertura, de modo que a admissão puxasse o ar quente do
tubo, em vez de só usar o ar gelado e úmido que criava gelo no
carburador.
Fui
até a tal granja, retomei a rota, mas tinha um ventinho de proa, coisa pouca,
mas que sempre segura e alonga o tempo
de vôo.
Passei
São Pedro do Sul, onde sai o tradicional Encontro Gaúcho de Ultraleves, por Santa
Maria com seus Xavantes e helicópteros Puma, já a estas alturas de olho na
progressão do vôo e do consumo. Com o tanque adicional que pusera onde iriam os
pés do carona, saíra na última decolagem com uns 45 litros. O consumo do Netuno era de 17 litros
por hora. Tinha, assim, duas horas e quarenta minutos para chegar a algum lugar
sem uma gota sobrando. O trajeto inicial previsto era duns 180 km. Isto
significava, em circunstâncias totalmente favoráveis duas horas de vôo. Já
queimara vinte minutos com o retorno à
pista, para “acionar o ar quente” o que já me levava para as duas horas e vinte
minutos. O desvio de rota comera mais dez minutos, duas e meia. Tinha dez
minutos para compensar vento de proa.
Os
indicativos eram de que iriam sobrar minutos e faltar litros.
Falavam
as más línguas que havia uma pista em Restinga Seca, mas que ninguém sabia em
que estado estava. Se os Zurrilhos Sem e/ou os Tatus Sem Terra não a tinham
invadido, ninguém podia garantir. Além do mais, era mais um desvio e, caso a
pista estivesse impraticável, aí mesmo a gasosa não daria para chegar na
pistinha onde o apoio me esperava.
O
que não tem solução, solucionado está: vamos ganhar uma alturinha, ficar sempre
de olho num campinho pretensamente alternativo para um pouso ...
Fui
até o que julguei a baba do tanque superior, cujo nível de combustível não
conseguia ver direito e passei para o tanque inferior, onde visualisava
direitinho a diminuição do preciosíssimo líquido.
Catei
o mapa e medi os dedos que faltavam para chegar a Novo Cabrais. Também medi
quantos dedos de combustível me restavam. A seguir apliquei um método
rigorosamente científico de comparar dedos no mapa com dedos no tanque. A
dedologia friamente calculada era implacável: somente a gasolina do tanque
inferior não me levaria até lá. Quanto tínhamos em cima? Ninguém sabia. O jeito
era pegar a rapa do tanque de baixo, passar para o superior e, na primeira
tossida de ar, mudar de novo para o inferior e escolher o melhor pouso embaixo,
questão duns quatro minutos de vôo.
Faltando
meio dedo no mapa, lá se foi o tanque reserva. Passei para o normal e não sabia
mais se olhava em frente ou se cuidava a primeira bolhinha de ar que passasse
pela mangueira, a fim de acionar o reserva de novo, sem apagar o motor.
E
nesse pavor fiquei até um quarto de dedo, já vendo a pistinha, mas sem ter a
certeza de que lá chegaria.
Pois
cheguei.
Começamos
a pôr combustível. Parecia que os tanques estavam furados, pois não paravam
mais de aceitar gasolina. Por mais uns cinco minutos de vôo, lá estaria eu mais uma vez pousado fora.
Fim
do “Capítalo”
Segue na próxima postagem
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Pilotagem de Risco
Caça Mergulhando no Mar
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