É Proibido Fumar
Até uma criança de dois
anos de idade sabe que é proibido fumar em locais onde haja manuseio ou estoque
de combustível.
Em
área aeroportuária, hangares, bombas de gasolina e similares, então, placas e
mais placas chamam a atenção de pilotos, mecânicos e os demais frequentadores para
a expressa proibição de fumar.
Pois
o blogueiro-escrevinhador é fotógrafo que se especializou em fotos aéreas,
estando, desde o início deste tipo de atividade, em constante circulação por
aeroportos, aeroclubes, pistas agrícolas e outros lugares onde se possa
conseguir um avião para fazer os voos panorâmicos. Claro que isso, neste ano da
graça de 2023 mudou muito, pois os drones estão tomando conta desta prestação
de serviço.
Mas
lá pelo final da década de oitenta, início dos anos noventa, foto aérea era
feita de avião, helicóptero ou satélite, o que me obrigava a andar alugando
avião por todo o Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e até no Uruguai.
Claro
que por uma questão de boa vizinhança, educação e necessidade de manter a boa
recepção por onde andasse, sempre procurava cumprir rigorosamente as leis,
regulamentos, restrições e medidas de segurança normais ao meio aeronáutico.
E
lá estava o humilde “retratista” como diz o Jader Dutra – decano dos pilotos
gaúchos – às voltas com o preparo dum avião para mais um voo de documentação
fotográfica numa determinada entidade, cujo nome não vou publicar, para
preservar os “interésses” como diria o Brizola.
Eis,
senão quando aparece um cidadão muito seguro de si, fumando bem próximo ao
avião em abastecimento. Querendo fazer uma certa média com os administradores
da entidade, educadamente aproximei-me de dito fumante pedindo-lhe que apagasse
o cigarro, em obediência às placas de aviso.
Claro
que fiz isto também com receio de que o imprudente fumante pudesse ser
confundido com alguém que estivesse comigo para o tal voo fotográfico.
Pois
o sujeito nem aí para o meu polido requerimento de preservação da saúde e
segurança dos aeronautas próximos ...
-
Cidadão, insisti, por favor, apague o cigarro. Aqui é expressamente proibido
fumar. O combustível dos aviões é gasolina de alta octanagem e uma fagulha aqui
representa uma ameaça muito grande de explosão.
Aí
mesmo que o sujeito deu uma tragada de fazer a brasa da ponta quase virar
labareda.
Não
me contive:
-
Meu amigo, parece que com jeito o senhor não quer entender a situação: se
continuar desrespeitando as normas de segurança, vou ser obrigado a pedir que o
senhor se retire daqui.
Ao
que ele retrucou:
-Mas
e quem é o senhor para me tirar daqui?
-
Eu sou um piloto visitante, que irá voar em minutos nesse avião e não quero ser
confundido com gente que causa problemas, desrespeitando as regras
aeronáuticas, o que pode fazer com que eu seja penalizado com proibição de novos voos aqui.
-
E se eu te garantir que não vai haver punição alguma para ti ou para qualquer
outro? - retrucou o sujeito num tom
atrevido e de provocação.
Prossegui
já meio saindo do normal, como diz a música aquela:
-
Isso não está em discussão. O que o senhor tem que fazer é apagar o cigarro e
ponto final. Se noutras situações há tolerância quanto ao descumprimento das
regras de segurança, aqui no aeroporto a coisa muda de figura.
-
Por gentileza, apague o seu cigarro.
-
Não apago! É só o que me faltava: um qualquer, vindo não se sabe de onde,
querendo me dar ordens.
-
Sou um qualquer, mas tenho treinamento e mentalidade aeronáutica: o que lhe
peço é para o bem de todos. Se o senhor não colaborar, vou ter que levar o caso
adiante.
-
Adiante como? Retrucou o fumante.
Comunicar
o pessoal do aeroporto, o DAC (faz tempo), a direção do Aeroclube, por exemplo.
-
Olha aqui, rapaz, vou continuar meu cigarrinho e não vai ser uma baixinho
magrela que vai me mandar apagar.
Aí,
tive quer partir para a queima de etapas:
-
O senhor está numa área particular, fiscalizada pela União Federal e se eu
levar o caso ao conhecimento do Presidente deste aeroclube o senhor vai se
complicar bastante.
Salientando
que estávamos nos tempos da Ditadura Militar, quando os membros das forças
armadas realmente mandavam. Podia até sair umas feriazinhas com despesas pagas
em hotel zero estrelas e com direito a uns “carinhos” como cigarro aceso na
sola dos pés, pau-de-arara, esses mimos ...
Mas
o homem era durão e não se intimidava mesmo.
Não
apagou o cigarro.
-
Bom, falei, vou ter que levar o caso adiante, antes que sobre pra mim.
E
para o piloto que iria fazer o voo avisei:
-
Me aguarda um pouquinho, que vou na secretaria conseguir o contato do presidente do aeroclube e já volto.
O
sujeito deu mais uma tragada e, irônico,
falou:
-
É desperdício de tempo.
Respondi:
-
Não é!
Replicou:
-
É, sim. E te provo que estou com a razão.
-
Então prove.
-
É perda de tempo procurar o telefone, pois o presidente do Aeroclube sou eu.
Aí
a coisa ficou complicada: eu precisava continuar voando na região. Os únicos
aviões disponíveis eram os de tal aeroclube. Que pepino!
-
Bem, o senhor há de me compreender, não fiz por mal. Apenas quis colaborar com a disciplina
aviatória, mas se o senhor acha que dá para fumar aqui, sabe que até me deu
vontade de acender um cigarrinho antes do voo?
Só
então me lembrei de que nunca fumei ...
Acontece
cada uma ...
E
é pura verdade, hein, Neco?
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Hospitalidade
Pura
Nunca é demais repetir a
grande hospitalidade da Terra dos Marechais – São Gabriel, para
com os pilotos que comparecem ao EPAER – Encontro de Pilotos e Aeronaves.
Também é de amplo
conhecimento da comunidade aeronáutica que este blogueiro é uma exceção em
termos de potencial econômico-financeiro neste meio, isto é, o próprio é um
duro com certidão emitida e autenticada pelas autoridades competentes...
Talvez por isto mesmo seja contemplado com uma deferência
especial pelo pessoal de São Gabriel. Como há uma casinha do antigo Clube de
Aerodesportistas que fica quase todo o tempo sem uso e, sabendo que a guaiaca
do fotógrafo anda meio vazia, o “Lambe-Lambe”, que não é de luxos, nem poderia
ser, quase sempre fica hospedado ali.
Neste ano não foi diferente: liguei, me confirmaram a
acomodação e se fumo ...
Chegando lá o Felipe me advertiu:
- “Lambe-Lambe” tu dá uma varrida. Isso tá sem
movimento há tempo.
Mas
vocês sabem como é: quem numa festa vai trocar um bom papo com amigos, mate,
cerveja por uma varrição a capricho?
Como
a camada de poeira não ultrapassava meio milímetro de altitude, relevei,
calculando que como não chovia dentro da casa, com certeza não haveria risco de
aquaplanagem num pouso de comandante um tanto quanto “Choppado”.
Eu disse choppado, não chapado ...
Fiz
uma vistoria superficial, estendi os lençois, ajeitei o resto das traquitanas e
me mandei pro hangar do festerê.
E
dê-lhe prosa, mentira, verdade, chopp, churrasco.
“Porementes”
tem a hora de ir pra pouso e hangarar.
Mas
isto depois dum churrasco primoroso, com uma costela bovina macia barbaridade,
finalizando com outra costela, agora de ovelha, claro que com a famosa
gordurinha.
Aproveitei.
Lá
pelas duas e meia da manhã, me acordo com as tripas na maior rebordosa e foi o
quanto deu para chegar ao banheiro.
Cá
comigo:
“Quem
manda um velho de setenta e um anos se atracar a comer carne gorda de noite? E
ainda refrigerada a chopp?”
Amanhã
vou maneirar – pensei.
E
voltei pros pelegos.
Mal
deitei já tive que pular e ser ligeiro que nem gato no charque. Foi o quanto
cheguei no vaso e deu-se o empuxo da turbina ...
Acho
que fui umas oito vezes à “patente” antes do nascer do Sol.
E
dê-lhe a xingar os criadores de bichos
tão irresistíveis e os assadores que faziam aquela carne derrubar as barreiras
salutares de qualquer cristão.
Isso
foi na sexta à noite.
No
sábado o dia amanheceu lindo, maneirei nas carnes e no chopp.
Tudo
parecia dentro dos conformes.
Felizmente
à noite foi um coquetel bem mais leve do que a churrascada da sexta.
O
domingo, ainda que com chuva a partir das 10 da manhã, foi outro de muita
convivência, alegria e, para variar churrasco de primeiríssima. Peguei leve na
carne e não bebi álcool, pois tinha a estrada de regresso a fazer.
Só
que sentia um certo mal-estar, cansaço, sonolência.
“Deve
ser pelo muito tempo em pé, forçando a coluna, a churrascada, o choppinho, etc. (especialmente
o etc.)”
Cheguei
em casa bem, só que cansado além da conta.
De
novo pros pelegos.
De
manhã, na segunda, o cansaço e o mal-estar continuavam: DNA – Data de
Nascimento Antiga, pensei...
Não
era.
Olhando
a mão esquerda, notei que na base do polegar esquerdo havia uma bolha em
formação.
Meu
diagnóstico certeiro: uma aranha me picou. Mas achei que fosse coisa sem consequência.
Compressa
caseira e a certeza de que nada mais sério acontecera.
Mas
não: a bolha crescendo.
Decisão:
amanhã cedo me mando para Santa Maria. E me fui.
Encurtando
a prosa:
A
picada da aranha marrom, uma das mais perigosas me escolhera. Ela é perigosa, porque
a picada é indolor, não incha, não avermelha e a gente só vai se dar conta da realidade quando
o estrago está bem grande, pois ela já pode ter causado um monte de problemas aos órgãos internos,
especialmente rins. A partir do terceiro
dia é que aparecem as bolhas, necrose local, etc., como fora o caso.
O
médico me falou:
- Tiveste
sorte. Ela inoculou uma quantia mínima de veneno. Mas a sintomatologia é da
marrom.
Fiz
o tratamento e, parece, está tudo dominado.
Agora
vejam vocês: lá a hospitalidade é tanta que até os insetos (?) vêm cumprimentar
a gente ...
Como
não sou de me entregar pros home, nem pras “marrom” vai um versinho:
Bem
como tinha que ser
Eu
me larguei do meu pago;
Chimarrão,
carne e bom trago,
Tudo
tinha no EPAER.
Muito
avião pra gente ver.
E
demonstrando seu dom
Muito
ás, piloto bom,
Em
aula de acrobacia.
Assim,
como é que eu iria
Ligar
pra tal de “marrom”?
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