sábado, 24 de março de 2012

Não Tá Morto Quem Peleia



Quando este manicaca era menor do que é, já gostava de ler e lia o que era possível conseguir, pois naquele tempo, morando na campanha, acesso a biblioteca, essas coisas, nem pensar.

Assim, quando algum parente chegava de viagem e deixava um jornal, uma "Cruzeiro" ou "Manchete", mesmo antigos, era uma festa. Também gostava da "Seleções", com suas histórias, Fatos da Vida Real, etc.

Impressionava-me o fato de os povoeiros lerem o jornal e o descartarem, em vez de guardarem numa prateleira, armário, sei lá. Para mim, aquilo cheirava a sacrilégio. Ora, se naquele papel estavam impressas letras e textos, era porque tinham algum valor e interesse. Assim, ler e jogar fora, inclusive para fins menos nobres como substituir a carqueja e o sabugo, só podia ser um baita pecado.

Lembro que ficava horas e hora na "patente", não nas famosas lutas de cinco contra um, mas lendo jornais velhos, que ali substituíam o papel higiênico, e os substitutivos gaudérios já citados, nem que fossem anúncios de tarecos já vendidos. O importante era ler, mesmo num ambiente, digamos, nem tão perfumado assim.

Pois numa das leitura de Seleções, impressionou-me a história dum piloto que enfrentou barra pesadíssima em voo - pane, tormenta - não lembro mais. Mas que sentiu o cutuco de verdade.

Contava ele que, sentindo a morte quase certa, não entregou os pontos e lutou até o final, "felizmente" feliz.

Em minha cabeça de guri não entrava a ideia de que alguém, vendo que ia morrer, continuasse fazendo coisas, buscando alternativas, raciocinando, enfim, não cristalizando. Para mim, perigo de morte era perigo de morte e não havia homem no mundo que tivesse o topete de enfrentá-lo com calma, mantendo o raciocínio, tomando decisões, agindo. Aquilo não passava de ficção, gabolice que a pessoa queria nos impingir como acontecimento real.

Vejam como são as coisas: passaram-se os tempos, enfrentei perigos em terra, virei piloto e andei levando cada cagaço, que vou lhes contar...

Pois não é que acabei conseguindo agir, nas minhas seis panes, incluindo duas de decolagem, meio parecido com aquelas histórias que lia...

Será que ficou lá no inconsciente, a mensagem: não tá morto quem peleia?

E não estou mentindo: teve uma pane em que, por teimoso, fui ser piloto de teste do "Três-por-Um", um avião construído por alguém que nunca foi piloto, nunca foi mecânico aeronáutico e que bolou o próprio projeto.

Todos esperavam cacaca, menos o construtor e o "piloco" Barbosa.

O piloco e o construtor perderam para todos ...

Na decolagem apagou-se aquele negócio que movimenta o ventilador de piloto (porque toda a vez que a hélice para, a gente sua ...).

Acreditem ou não: eu comecei a rir (até podia ser de nervoso). Ria e me xingava: "Bem-feito! Quem mandou não ouvir os conselhos para não voar nessa encrenca! Agora quero ver como vais te sair com o pouso nessas canas aí na frente ..."

E ria. Talvez o famoso couro curto do japonês ... Abria a boca em cima, porque embaixo cortava prego ...

Rindo de nervoso ou não, levei a craca a um pouso numa lavoura de arroz, em vez das canas, somente quebrando a triquilha e lascando a hélice. Infelizmente, quando o avião é dos outros eu preservo e os meus eu detono ...

Tive outras situações em que achei chegada a hora de ir prosear e tomar mate com o São Pedro. Sentindo a pua, mantive a calma e fiz o que era certo, felizmente, dando certo.

Estou pensando em alterar a lei de Murphy, onde "se pode dar errado, vai dar errado".

Declaro estabelecida a Lei do Barbosa "Lambe-Lambe":

Art. 1º - Se pode dar certo, vai dar certo.

Art. 2º - A lei de Murphy sempre será aplicada subsidiariamente, nos casos em que não se possa aplicar o art. 1º.

Esta Lei entrará em vigor imediatamente após sua publicação no blog.
Revogam-se as disposições em contrário, a favor ou indiferentes.

Gabinete dum piloto que não tem coisa melhor a fazer, 19 de março de 2012.

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